domingo, 18 de janeiro de 2015

Entrevista: Aisha Hadarah


"Resumidamente, acho que a Dança do Ventre beneficia em primeiro lugar a autoestima da praticante e desenvolve consciência corporal. Principalmente consciência da musculatura do baixo ventre, esquecida por muitas mulheres. Isso é algo que o Tribal também faz, além de desenvolver o espírito de unidade entre um grupo e a conexão com as raízes."

DVNF: Conte-nos um pouco sobre sua trajetória na dança do ventre?
AH: Iniciei na Dança do Ventre em 2002 numa academia pequena. Saía da escola e ia pra aula. Não tinha a menor pretensão de ser profissional. Dois anos depois encontrei o Asmahan, onde comecei a me aprofundar na dança e fazer shows. Lá fui convidada a ingressar no grupo Naqaala, da minha professora Noahri, que participou ativamente dos festivais no Rio, levando muitos prêmios pra casa. Também lá comecei a dar as primeiras aulas e montar os primeiros shows. Participei de muitos concursos na cidade e no estado do Rio de Janeiro, obtendo vários prêmios solo e alguns em grupo. Depois de 5 anos, passei a estudar no Espaço Mosaico, onde também fui ser professora. Nesta época fui pela primeira vez ao Egito e participei do festival Ahlan Wa Sahlan, e aquela viagem marcou muito minha forma de ver a dança. Passei a dar aulas nas escolas Sol y Luna Danzas, Espaço Chandra e Surya, EDM Kamillah Franklin, Kelimaski e Studio de Dança Mahira Safie. Fui convidada a ingressar no grupo Al Qamar, dirigido por Melinda James, e a coordenar shows mensais no Restaurante Al Khayam. Hoje dou aulas quase todo dia, estou sempre produzindo um show e fazendo algum workshop. Como muitas pessoas próximas a mim sabem, já tentei largar a Dança do Ventre por motivos de decepção com o meio, mas a dança me chamou de volta todas as vezes que pensei em desistir e hoje eu crio meio próprio meio, como fui aconselhada.

DVNF: Quais foram os professores que mais marcaram o seu aprendizado e por quê?
AH: Noahri Mahin, que foi minha principal professora e moldou todo o meu estilo de dança; e Melinda James, minha atual professora, que escolhi quando voltei à estudar por ter sempre admirado seu trabalho e seu estilo.

DVNF: Quais foram suas primeiras inspirações? Quais suas atuais inspirações?
AH: Minhas primeiras inspirações foram minhas professoras, Kahina e Jillina, que eu lembre. Hoje sou apaixonada pelas egípcias (e egípcios), por isso Gamal Seif e a eterna Souheir Zaki.

DVNF: O quê a dança acrescentou em sua vida?
AH: Acho que posso dizer TUDO. Meus maiores amigos vieram da dança e as melhores histórias da minha vida vieram trazidas pela dança. Todo o meu modo de lidar com as pessoas foi desenvolvido a partir da dança e uma total explosão do consciente feminino.

DVNF: O quê você mais aprecia nesta arte?
AH: A ligação com o feminino, as raízes e o ancestral, sem falar na beleza.

DVNF: Você já sofreu preconceitos na dança do ventre ou no tribal ? Como foi isso?
AH: Sim, muitas vezes dançando em shows contratados ouvi piadinhas sobre a dança, vindas de gente desinformada. E uma vez, numa gravação externa, todas as bailarinas de dança do ventre presentes ouviram desaforos de transeuntes. Realmente triste.

DVNF: Houve alguma indignação ou frustração durante seu percurso na dança?
AH: Houve muita, mas hoje eu percebo que faz parte da vida. A dança mexe muito com o ego das pessoas e isso dá origem a maioria dos problemas.

DVNF: Como é ter um estilo alternativo dentro da dança. Conte-nos um pouco sobre isso.
AH: Eu sempre fui meio assim... Meu cabelo é vermelho desde os 13 anos de idade, eu amo minhas tatuagens e meus piercings, e adoro mostrá-los. Acho que na dança tem-se mais liberdade de exibir estilos assim, por isso sempre fui atraída por artes em geral. Pra mim é tipo um complemento do figurino!

DVNF: Você transita por modalidades diversas de dança, apresentando bons trabalhos de Dança do Ventre, Folclore, tribal e dança cigana. O que a motivou a buscar cada um desses aprendizados?
AH: A Dança do Ventre me atraiu a princípio pela conexão com o sagrado feminino. Acabei me aprofundando nela como dança e descobri o Folclore Árabe, que é uma paixão na minha vida. O Folclore Árabe me encantou por abrir a possibilidade de estudar povos distantes, suas vestimentas e seus costumes traduzidos em dança. O Tribal também conheci através da Dança do Ventre, quando ninguém fazia idéia do que era aquilo, e fiquei imediatamente atraída pelo figurino carregado de referências étnicas. Já a Dança Cigana foi algo paralelo à Dança do Ventre, que descobri e que me descobriu. Só posso dizer que é espiritual.

DVNF: Você poderia destacar os pontos positivos do estudo de cada uma dessas danças?

AH: Resumidamente, acho que a Dança do Ventre beneficia em primeiro lugar a autoestima da praticante e desenvolve consciência corporal. Principalmente consciência da musculatura do baixo ventre, esquecida por muitas mulheres. Isso é algo que o Tribal também faz, além de desenvolver o espírito de unidade entre um grupo e a conexão com as raízes. Pesquisando Folclore Árabe acaba-se estudando História, Geografia e Antropologia, isso quando você não começa a estudar árabe também... E a Dança Cigana também entra por esse mesmo caminho.

DVNF: E como uma pode influenciar no estudo da outra? Há pontos convergentes? E divergentes?
AH: Eu já cansei de fazer giro de tribal no meio da clássica de dança do ventre, então às vezes confunde um pouco... Ou vai ver sou eu. Acho que uma das coisas que mais se diferencia nessas danças mencionadas é a postura de braços. A Dança do Ventre tem certos braços, o Tribal tem outro, a Dança Cigana já é outro e o Folclore vai ter braços diferentes em cada estilo. Obviamente temos a diferença nos passos, ritmos, mas acho que os braços diferem muito.

DVNF: Como  e quando você descobriu o tribal fusion e por que se identificou com esse estilo?Quando começou a praticar o tribal fusion? 
AH: A primeira vez que vi tribal foi num vídeo antigo do BellyDance Superstars, era a Rachel Brice e fiquei fascinada. Me identifiquei com o poder que aquela imagem passava e o figurino étnico magnífico. Comecei a praticar o tribal no Asmahan, onde fui aluna e professora por 5 anos, e integrei a Cia. Caballeras e a Tribo Mozuna.

DVNF: O que você mais gosta no tribal fusion?

AH: Amo os figurinos com referências étnicas e a possibilidade de fusões com outros estilos de dança, como as que mais gosto: cabaret e balkan.

DVNF: Você poderia explicar um pouco a respeito da diferença do Tribal Fusion para as fusões que tem sido feitas da dança do ventre com outras danças?
AH: Quando se chama uma dança de Tribal Fusion ela deve ter base nos passos do ATS® e ser fusionada com outro estilo a partir daí. A fusão de Dança do Ventre com outra dança, por exemplo, Hip Hop, não é uma fusão Tribal, pois não tem sua base ATS®. Esta é a diferença.

DVNF: Para trabalhar fusões você considera que seja necessário haver um estudo mais aprofundado das modalidades de dança com as quais se quer trabalhar?
AH: Obviamente que sim, pois além de enriquecer a coreografia não cometemos nenhuma "gafe".

DVNF: Como foi fazer parte de um grupo de ATS®, como a Tribo Mozuna, dirigido por Nadja El Balady e Aline Muhana? Qual a importância que você vê no ATS®?
AH: Foi uma ótima experiência da qual guardo ótimas recordações. Nós tínhamos ensaios semanais e nos apresentávamos todo mês. Nadja El Balady ainda é minha professora de ATS®.

O ATS® é a raiz do Tribal, lindo e hipnotizante, com uma missão que muitos esquecem: unidade em grupo, espírito de tribo.

DVNF: Conte-nos sobre seu gosto pelo estilo balkan. Como surgiu a oportunidade de dançar no GoEast Festa e como foi a experiência?
AH: Amo o Leste Europeu, é minha parte preferida nas danças ciganas. Eu era amiga de músicos e das produtoras da GoEast Festa e sempre ia nos ensaios da Go East Orkestar e nas festas que eles faziam. Aí lançaram um concurso para dançar na festa e participei com as minhas amigas e companheiras de dança Carol Schavarosk e Nadja El Balady. Acabamos dançando juntas as três ao vivo com a Go East Orkestar e depois fui convidada para dançar em solo com orquestra mais vezes, sempre sendo uma experiência única.

DVNF: Qual a importância que você enxerga no estudo das Danças Folclóricas do Oriente Médio para a dança tribal?
AH: Acho importante estudar pra entender de onde vêm certas peças do figurino tribal e o que elas representavam em seu contexto original. Dos passos, existem alguns que foram absorvidos para o tribal, mas a dança folclórica que supostamente seria a base do ATS® é o Ghawazee, onde você encontra muitos dos passos que deram origem aos utilizados no ATS®, incluindo também a utilização dos snujs.

DVNF: Você tem muitas conquistas em concursos. Como foi sua trajetória na participação deles e o que eles trouxeram de positivos para você?
AH: Eu lembro de ter dito que nunca ia competir, mas um dia resolvi testar minha dança e fui no mesmo dia competir com Dança do Ventre e Folclore Árabe, ambos solos. Fiquei absurdamente surpresa quando ganhei terceiro e primeiro lugares respectivamente. Quando recebi as avaliações achei muito interessante ver que todos falavam nos mesmos pontos fortes e nos mesmos pontos fracos. E pude estudar a partir daí. Então, os concursos se tornaram um motivo de estudo pra mim, sempre me baseado nas avaliações que recebia. Como foquei no Folclore Árabe, acabei me tornando conhecida nesse aspecto, o que me rendeu convites para workshops e shows. Posso dizer que os concursos foram uma ótima experiência pra mim em muitos níveis, mas uma vitória também é subir num palco pra se permitir ser julgado. Todos que fazem isso são muito corajosos e estou contente comigo mesma por ter feito e ainda de quebra ter ganhado troféus.

DVNF: Como é o cenário da dança tribal no Rio de Janeiro? Pontos positivos, negativos, apoio da cidade/estado, repercussão por parte do público bem como pela comunidade de dança do ventre/tribal?
AH: Acho que o Tribal no Rio ainda não é muito conhecido, muitas pessoas ainda não sabem ao certo o que é ou têm uma idéia totalmente errada. O ideal é que surjam mais pólos de estudo de tribal e mais festivais voltados para o estilo.

DVNF: Buscando conhecer um pouquinho mais a respeito da multiplicidade que é a Aisha Hadarah, gostaríamos de perguntar sobre sua profissão como fotógrafa. Como é esse olhar para o corpo que dança através das lentes? E como o fato de você também dançar contribui para a qualidade de seu trabalho?AH: Multiplicidade, falou tudo. Eu amo fotografar beleza então tento extrair a beleza existente em cada uma. O fato de eu também ser bailarina é o que faz a maioria das bailarinas me procurarem pra fazer um book. Elas ficam mais à vontade por eu ser como elas, entender dos figurinos, das bijuterias, dos acessórios e, principalmente, das poses. A maioria das meninas fica muito tímida na frente da câmera, então, eu vou dirigindo as poses até que a bailarina surja de dentro delas. Sempre dá certo!
DVNF: Você tem um atelier de figurinos tanto para dança do ventre quanto para tribal. Como surgiu a ideia ou oportunidade de formá-lo? Como é o processo criativo para as linhas e suas inspirações para a composição das mesmas? Há alguma curiosidade a respeito do ateliê?
AH: Tive o primeiro atelier com outras duas bailarinas, depois dei uma pausa e voltei a produzir sozinha. Quis unir minha experiência com o design de moda às criações, por isso comecei a montar as peças. É difícil descrever o processo criativo pois eu tenho fases, então as criações são de acordo com essas fases. Estive fazendo uma renovação no atelier e esse ano terão muitas novidades.

DVNF: Como você descreveria a sua dança hoje?

AH: Hoje acho que minha dança está bem ao estilo egípcio, devido aos meus estudos, porém sempre com braços um pouco fusionados.

DVNF:  Improvisar ou coreografar? E por quê?
AH: Eu nunca coreografo nada inteiro, somente faço marcações de tempo e finalizações. Improviso quando preciso, foram muitas vezes na vida... E coreografia somente em grupo, aí eu faço direitinho.

DVNF:  Você trabalha somente com dança?
AH: Não, sou artista plástica e designer, acabei virando fotógrafa e tento unir isso tudo num só caminho.

DVNF: Quais seus projetos para 2015? E mais futuramente?
AH: Pretendo voltar ao Egito pra estudar e estou produzindo alguns shows e workshops.

DVNF: Deixe um recado para os leitores do blog.

AH: Deixo esse texto de Osho que vale a pena lembrar:

"A palavra coragem é muito interessante. Ela vem da raiz latina cor, que significa "coração". Portanto, ser corajoso significa viver com o coração. E os fracos, somente os fracos, vivem com a cabeça; receosos, eles criam em torno deles uma segurança baseada na lógica. Com medo, fecham todas as janelas e portas – com teologia, conceitos, palavras, teorias – e do lado de dentro dessas portas e janelas, eles se escondem.

O caminho do coração é o caminho da coragem. É viver na insegurança, é viver no amor e confiar, é enfrentar o desconhecido. É deixar o passado para trás e deixar o futuro ser. Coragem é seguir trilhas perigosas. A vida é perigosa. E só os covardes podem evitar o perigo – mas aí já estão mortos. A pessoa que está viva, realmente viva, sempre enfrentará o desconhecido. O perigo está presente, mas ela assumirá o risco. O coração está sempre pronto para enfrentar riscos; o coração é um jogador. A cabeça é um homem de negócios. Ela sempre calcula – ela é astuta. O coração nunca calcula nada."

Mil Beijos, Aisha Hadarah



Contato:
www.aishahadarah.com.br

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 http://www.photoartestudio.com.br/

Por Aerith & Ju Najlah

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